Monday, April 30, 2007

A Geni das TVs, e de turbante

Acusada por Israel de anti-semita, pelos EUA de anti-americana, e de adotar posturas “claramente contrárias ao governo” por Egito, Síria, Jordânia, Marrocos, Sudão, Bahrain e Iraque (nas versões Saddam e pós-Saddam), a Al-Jazeera mais parece a versão news broadcast da Geni de Chico Buarque. Todos se aproveitam dela, e não têm pudores em enchê-la de porrada uma vez consumado o abuso.

As grandes redes deram ampla divulgação (ao modo deles, claro) dos vídeos obtidos pela rede para satanizar Osama bin Laden e a Al-Qaeda, enquanto fecham os olhos para as violências cometidas contra seus profissionais ou mesmo se juntam ao coro dos que a apontam como porta-voz do terrorismo. É o preço que se paga por ter uma linha editorial que desagrada dos ashkenazis aos pashtuns.

A Al-Jazeera nasceu no Qatar em novembro de 1996, das cinzas da BBC Arabic Television, fechada sete meses antes devido a uma “pequena discordância” entre os ingleses e os patrocinadores sauditas – a tentativa de censura a um documentário sobre execuções judiciais na Arábia Saudita. Hoje, emprega cerca de 350 jornalistas, sendo 30 correspondentes internacionais.

Fundada pelo Emir do Qatar, xeique Hamad bin Khalifa al-Thani, a rede começou transmitindo apenas seis horas por dia. No ano seguinte, já haviam passado para 12 horas, e, em 1999, chegaram às 24 horas sem pausa. Só veio a ser conhecida do povão, contudo, quando levou ao ar aquilo que as redes americanas seriam depois proibidas pelo governo de transmitir: a palavra do homem que, supostamente, ordenou o ataque de 11 de setembro de 2001.

Seu papel no conflito árabe-israelense lhe valeu a condenação do ex-primeiro-ministro Shimon Peres de “incitar o ódio” contra judeus e “encorajar o terrorismo”. Em outubro de 2002, o secretário de Estado Colin Powell (que a chamou de “irresponsável”) foi reclamar ao Emir, pedindo mudança na cobertura. Levou de volta uma merecida banana e uma frase de efeito:

“Nosso juiz é o público”.

Enganam-se os sharonetes, no entanto, se pensam que os repórteres da Al-Jazeera são recebidos a doce de coco pelos governos árabes. Nos últimos anos, a rede e seus profissionais foram alvos das mais covardes e violentas tentativas de censura, vindas de todos os lados.

Não pretendo tratar da Síria e da Arábia Saudita porque o buraco lá é bem mais embaixo. Bashar Al-Assad e o rei Fahd bin Abdulaziz al-Saud preferem, em vez de simplesmente censurar, usar a Al-Jazeera para identificar e prender os opositores de seus respectivos regimes. Ser fonte da Al-Jazeera lá é crime.

No mais, vejamos...

Em agosto de 2002, o ministro da Informação da Jordânia, Muhammad Adwan, cassou a licença da Al-Jazeera para atuar no país, sob acusação de “provocar sedição no reino” e difamar a família real. Segundo Adwan explicou em entrevista à Agence France Presse, a rede “ultrapassou todos os limites da decência em seus programas ao atacar os líderes da nação e sua nobreza”.

Isso porque convidaram para um debate político um professor americano de origem palestina que afirmou com todas as letras que a família Hussein é subordinada aos interesses americanos.

Em novembro do mesmo ano, o Kuwait seguiu o exemplo da Jordânia. Fechou, pela segunda e última vez, o escritório da rede por lá. O motivo? Reportaram, como convém, que um quarto do país foi entregue ao controle americano à guisa de “espaço para manobras militares” para a “Guerra do Golfo, parte II – A vingança do filho”. Por outro lado, no Bahrain, foram proibidos de cobrir as eleições municipais.

O ministro da Informação, Nabil Yacub el-Hamer, acusa a Al-Jazeera de estar “infiltrated by Zionists”. Na onda, foram censurados também cinco websites mantidos pela oposição no país. As autoridades informaram que eles eram “plataformas para espalhar notícias tendenciosas, rumores e mentiras”. Diferem em algo das americanas?

Em dezembro de 2005, o Sudão também aderiu à moda. Policiais invadiram o escritório da rede em Khartoum, detiveram o chefe da sucursal, o jornalista Islam Salih, depois julgado e condenado a um mês de prisão e multa de 3,2 mil euros, e confiscaram equipamento sob o pretexto (tão falso quanto uma nota de dois dólares) que o maquinário não teria situação regular perante a alfândega.

O motivo de fato? A Al-Jazeera levou ao ar reportagens sobre a escalada da tuberculose entre os trabalhadores braçais nas minas e sobre a guerra civil no sul do país.

Ode a um Herói anônimo

Toda vez que vejo o semblante do judeu grego – e aqui não vai nenhum ponta de anti-semitismo, por favor – que fez fortuna mediante a esperta aplicação de uma das mais velhas fórmulas inventadas pela raça humana para lidar com as massas populares (à base de trigo cozido e diversão de baixo custo e nível), me lembro da singela história de um herói nacional quase anônimo. Vale lembrá-la, para que as gerações posteriores jamais se olvidem da prolífica e abnegada obra deste herói, não por acaso um Jornalista.

Os bondosos generais que tomaram o poder em 64 preparavam-se para entregar o país de volta a uma meia dúzia de civis com os bolsos cheios do resultado da cooperação com o suave regime instalado naqueles últimos 21 anos dourados. Anos em que um governo ilegitimamente constituído – ora, e qual foi legítimo nesta nossa república mesmo? – matou apenas alguns poucos centenas de cidadãos e desapareceu com outras tantas, contra os milhares e milhares dos sanguinários regimes de alguns de nuestros hermanos latinos.

Logo no início do governo da “abertura”, decidiu-se por criar duas novas "vagas" para emissoras de TV nacionais. Ocorre que o “nº 1”, o homem que está no poder, detém a prerrogativa de conceder a quem ele desejar, ou ao que realizar o melhor tráfico de influência ou àquele que despejar mais dinheiro em seus bolsos através dos injustamente crucificados lobistas, a concessão de exploração dos serviços de transmissão de rádio e TV. Assim era então e assim o é até hoje.

Dois jornais que desempenharam o desagradável papel de expor os pontuais desvios do regime – como a instalação de um mecanismo de governo que sistematicamente violava os direitos dos cidadãos que deveria estar defendendo, dos nobres objetivos da redentora revolução – pleiteavam as concessões.

Rapidamente, nosso Herói (ex-assessor de imprensa do mesmo general) se mobilizou para garantir que uma delas ficasse nas mãos do seu então patrão, que não era jornalista, mas um gráfico cuja experiência jornalística praticamente se resumia a uma revista de fotos grandes e dedicada ao puxa-saquismo do governo em tempo integral. A única coisa que poderia comprometer a concessão era o fato de a referida revista fazer uma cobertura carnavalesca que beirava o pornô.

O intimorato Jornalista não teve dúvidas: candidatou-se a vaga de guardião da moral da nova emissora, e conquistou o objetivo. O mesmo abnegado homem de notícias ainda ajeitou o meio de campo para que o ex-camelô com queda para o trambique honesto, que explora apenas a boa fé da pessoa, assumisse o outro, privando-nos para sempre da possibilidade de uma emissora de TV minimamente inteligível.

Colocou-o em contato, por acaso, com um militar com quem o camelô servira no quartel e os dois puderam relembrar muitos episódios da caserna enquanto discutiam a proposta de uma rede que não se metesse muito nesse negócio de política, que é bastante complicado. Como “seu Sílvio” estava interessado mesmo era em grana, não houve problema. Não bastasse isso, o sobrinho do camelô era genro do milico que comandava a CIA tupiniquim, o que só fez facilitar a aproximação.

Nos anos seguintes, uma destas faliu, deixando milhares de pessoas desempregadas e sem perspectiva de receber o dinheiro que lhes era devido. Constatou-se que o tal gráfico sabia ser mau patrão como poucos outros o foram, deixou milhões em dívidas trabalhistas e 28 mil cheques sem fundos na praça.

A outra se tornou uma das legítimas encarnações do “ópio do povo” de que falava um daqueles velhos pensadores alemães com nome de quem está limpando a garganta. E tornou multimilionário o seu dono, cuja única incursão pelo mundo da política – uma candidatura a presidente na eleição de 1989 – foi sepultada simplesmente porque ele tinha se esquecido de um detalhe banal como a filiação legítima a um partido político. Teve de comprar a sua, mas o tribunal eleitoral não viu isso com bons olhos porque ele não era cliente da casa e estava atrapalhando um momento muito delicado. Era, afinal, a primeira vez em quase trinta anos que eles teriam de nos fazer acreditar que de fato escolhemos quem nos governa.

O Jornalista de notável dedicação à causa dos seus patrões e incontestável abnegação que nos proporcionou isto tudo fez fama nesta primeira rede – a do gráfico. Apresentava um programa não tratava de assuntos pesados e chatos como denúncias de corrupção, favorecimento, fraude e nepotismo que grassavam debaixo dos negros e vastos bigodes presidenciais. Ou mesmo o dia-a-dia daqueles valorosos homens que estavam retomando o controle das rédeas nacionais para a elite que sempre as teve em mãos.

Nada disso. Ele escolheu assumir o valioso – mas desprezado – papel de bobo da corte.

Em horário nobre, apresentava esquetes leves contendo material de absoluta relevância política como os tiques-nervosos dos políticos e seus gracejos e atos falhos entre um e outro discurso. Dedicava-se com afinco a transmitir ao máximo possível da população brasileira que determinado senador não conseguia pronunciar corretamente a palavra “problema”, por mais que seus assessores soprassem, entre outras valorosas contribuições ao mundo da imprensa. Para que gastar tempo com os projetos em discussão?

O conteúdo do quadro – ou a falta dele – chamou a atenção do Todo-Poderoso Ser Global, que o convocou para servir em suas hostes. A princípio, foi para ocupar posição similar à que ocupava na emissora anterior, mas depois o afilhado dos generais alçou vôos mais altos dentro da empresa do dono do país. E ainda relatou esse episódio todo em um livro para comemorar seus feitos, magnífica obra lançada em 1985.

Hoje, ele ganha mais do que eu, você, e pelos menos mais uns vinte amigos nossos juntos. Mordam-se de inveja, e palmas pra ele.

Thursday, April 26, 2007

O que explica muita coisa...

A Fanta foi criada na Alemanha, em plena Segunda Guerra, pelo representante local da Coca-Cola Company, para compensar a perda de vendas resultando dos boatos de que a empresa seria de propriedade de judeus. Parece teoria da conspiração, difícil de acreditar? Mas não é nenhum segredo.

A Coca-Cola decidiu, no ano passado, fazer um concurso para recriar as propagandas da Coca-Cola no III Reich. Quando foram explicar pros participantes o contexto da brincadeira (http://www.mtcp.co.uk/coca-cola/background.php), tem escrito lá no meio:

"Coke financially supported the Nazis by advertising within Nazi newspapers, in one instance Coke published responses to accusations from rival bottlers that they were a Jewish company. These denunciations were placed in Nazi rags."

Em "A Fórmula Secreta", do jornalista Rick Allen (Editora Objetiva, 1994, excelente leitura), há uma versão minuciosamente narrada do episódio. Allen conta que começou a circular entre esses engarrafadores rivais cópia de um balanço financeiro escrito com caracteres hebraicos. Provavelmente foi obra de um contador judeu qualquer do departamento financeiro, mas o papel foi usado como prova de que a Coca-Cola era judaica até as raízes de coca e de kola.

Max Keith, o CEO da empresa na Alemanha, foi pressionado diversas vezes a admitir nos cargos de direção integrantes do alto escalão do gabinete de Hitler. Negou-se todas e foi perseguido. Na sede da Coca-Cola nos EUA, em Plum Street, Atlanta, os funcionários graduados todos achavam que Keith estava colaborando com os nazistas, o que poderia se tornar embaraçoso para a imagem mundial da companhia.

Quando Hitler caiu, mandaram uma comissão lá investigar o que ele andava fazendo, com vistas a demiti-lo. Os investigadores voltaram com os dados que mostravam que Keith além de não sucumbir às pressões, criou a Fanta para contornar a queda de receita advinda da histeria anti-judaica. O pré-julgamento de Keith fora equivocado, reconheceram os executivos, que forjaram a historinha segundo a qual a falta de matéria-prima para o xarope teria levado Keith a produzir a Fanta, que na época nem tinha gosto de laranja ou uva.

Tanto que com a entrada dos EUA na Guerra, o presidente da empresa, Robert Woodruff, obteve do general Eisenhower permissão para instalar fábricas de Coca-cola em diversas frentes de batalha. Eisenhower, não por acaso, sempre era visto com uma Coca-Cola na mão. Isso tudo foi parte de uma campanha intensa da COca-Cola Company para grudar a sua imagem ao esforço de guerra e escapar de uma restrição fenomenal nas quotas de açúcar que teriam direito para produzir o xarope.